Cérebro, uma super rede de pequenas redes.

HoMyfate9

{in Ensaio: Redes, Ritmos, Sincronia e Sinergia*} Vivemos numa idade das redes [Sporns]. Mais do que evidenciar este postulado poderia propor que vivemos numa era que em finalmente começamos a entender que vivemos baseados em redes, e mesmo que a evolução do homem e dos sistemas que o suportam dependem destas.

A importância das redes tem sido uma preocupação de longa data nas ciências sociais onde se tentado tenta perceber através de análises quantificativas padrões de comportamento e de relações entre humanos e entre grupos, os ecossistemas, as sociedades ou a economia global, mas também, mais recentemente, nas ciências naturais, com particular foco nos sistemas biológicos complexos, incluindo o cérebro [Sporns].

Mas também tem sido uma preocupação da ciências matemáticas e engenharias informáticas, não só pelo facto de as redes computacionais serem o seu objecto principal de estudos e experiências, mas também porque muitos cientistas viram a necessidade—e perseguem e partilham essa ideia—de propor um cruzamento transdisciplinar entre todas áreas que de alguma forma incutissem a questão de rede(s) no seu objecto de estudo, para que todas se compreendessem melhor a si mesmas e pudessem contribuir, dessa forma, para uma teoria mais geral e consensual.

O cérebro é multi-sistema complexo cuja arquitectura assenta em múltiplos sistemas e camadas (grupos de neurónios dedicados a certas rotinas ou funções, como o sistema auditivo) ligados em rede, que comunicam entre si através de potenciais eléctricos (sinapses) [Sporns]. Baseia-se, assim, numa relação e interoperabilidade de micro-sistemas, constituídos pelas células individuais e sinapses, e macro-sistemas consubstanciados pelo sistema cognitivo e a encarnação da cognição. Este sistema e os seus processos podem ser encontrados em sistemas como as redes sociais que se sustentam necessariamente não só em relações interpessoais, mas também nas relações entre grupos, nas suas micro-ecologias e micro-economias e, de uma forma mais abrangente, numa macro-escala, entre países [Sporns].

Há métodos matemáticos quantitativos que têm ajudado a esclarecer a arquitectura em rede do cérebro como a dos grafos, pois estes ajudam a conceptualizar a interconecção (arestas) e relações entre os seus constituintes (nós). As arestas representam as conecções (binárias) entre os nós como a amizade entre pares [Sporns]. Há grafos que estabelecem relações entre si através de conecções binárias, mas tanto directas como indirectas, mas também por densidade (weight) [Sporns]. A densidade pode ser importante porque determina o grau de força que os nós podem deter e este grau pode determinar a forma como os nós se interligam e participam na ecologia das redes.

Mas interessante é a multiplicação de ligações (arestas) que se podem estabelecer em redes de múltiplos nós (vértices). Uma rede de dois vértices liga-se através de uma aresta, uma rede de três por três, mas uma de quatro pode estabelecer cinco ligações. A fórmula é interessante até para as artes visuais pois relaciona-se com polígonos (e poliedros, se a colocação dos nós for tridimensional). Um grafo completo de n vértices (nós) nós tem n(n-1)/2 de arestas (ligações)—(um número triangular) e pode ser representado pela expressão K[Gries]. Assim um K3 = 3, um K4 = 6, mas um K7=21 ou um K11=55.

{200 biliões de conecções} Podemos agora, mais facilmente, entender que a ligação de 100 mil milhões de neurónios (10 ¹¹) pode estabelecer um número verdadeiramente extraordinário de conecções (sinapses). [Buzsáki]

Mas não é só na quantidade que o cérebro se apresenta como extraordinário. O arquitectura deste é inteligente porque para além da quantidade de neurónios e ligações possíveis estes organizam-se em clusters, i.e, pequenas redes—que são vistos como vantajosos para todo o sistema pois permitem uma organização local especializada e um sistema de conecções aleatório optimizado—e apesar do sistema de cluster possibilitar o ataque de agentes (podemos estabelecer um paralelo com o hacking nas redes computacionais) que podem levar a doenças do tipo Alzeimer (que é caracterizado por lesões localizadas em clusters cortinais) os estragos aleatórios das colunas corticais nunca resultam na perda total de todas as faculdades , como a capacidade de reconhecer um determinado livro, um dedo, ou um familiar [Buzsáki].

Ou seja, um sistema acentrado, distribuído, de constituintes traz várias vantagens e também estabelece um paralelo mais consistente com a conceptualização das redes neuronais, pois estas consistem “num conjunto de elementos, os neurónios formais, e ligações sinápticas, também chamadas de pesos, entre eles” [Machuco].

O cérebro pode ser entendido, assim, à luz das aproximações que a matemática tem feito em relação às redes computacionais, mas também, vice-versa, a internet (rede de redes—as redes computacionais, e interligação que a configura) têm tido uma evolução que cada vez mais se aproxima do cérebro, a um nível que tem superado as expectativas mais optimistas.

A evolução tem sido tal que há cientistas que estabelecem um paralelo cada vez mais consistente entre a internet e o cérebro e propõem mesmo que é incontornável a passagem desta a uma espécie de World Wide Brain [Goertzel].

Assume-se também que a mente (mind) pode ser entendida, com um alto nível de acuidade, como um sistema de algoritmos interactivos (ou algo-ritmos?) que assentam numa autopoiesis. Mas a ideia de uma evolução “autómata” pode não depender de fenómenos já convencionados, mas de outros menos estudados ainda, como as oscilações e a sua relação. Ou seja que estes constituintes podem contribuir com os ritmos específicos para uma autogénese ao longo de um percurso—não necessariamente cronológico—e que este processo configura a evolução do sistema e dos seus constituintes.

 

Horácio {Tomé Marques}
de Originais de 2010, 2011

* Este texto é parte integrante do Ensaio: Redes, Ritmos, Sincronia e Sinergia, publicado em julho de 2011, respondendo a uma necessidade programática da UC Teoria da Comunicação integrada no ano curricular do PDMD – Programa Doutoral em Media Digitais, programa que persigo há cerca de três anos.

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Referências {algumas importantes relacionados com estes parágrafos}

– BUZSÁKI, György (2006). Rhythms of the Brain. Oxford: Oxford University Press.
– GOERTZEL, Ben (1993). The Structure of Intelligence: A New Mathematical Model of Mind. New York: Springer-Verlag.
– GRIES, David; SCHNEIDER, Fred B (1993). A Logical Approach to Discrete Math. Springer-Verlag, p. 436.
– ROSA, A. Machuco (2007). Dos Mecanismos Clássicos de Controlo às Redes Complexas. (em linha, visitado a 5 de Maio de 2010: http://paginas.ulusofona.pt/p138/ArtigoPortoLigacoes.pdf).
– SPORNS, Olaf (2011). Networks of the Brain. London. The MIT Press.