Deus ex machina ou ex digito?

HoMyfate11

{isto não é um post} O conceito da vida como radicado na abstracção das equações, dos algoritmos, da matemática não só como meio de explicação, mas como de veiculação, e mesmo de essência única, é um pensamento milenar, recorrente, persistente, que até já propôs que o universo, antes do big-bang, poderia ser não matéria, mas uma equação—o verdadeiro paradigma da abstracção, a matéria como “coisa” exclusivamente conceptual, ou o afísico como condição primordial de todas as coisas, do tangível e mesmo do intangível.

Mas a sintetização, mesmo a matérica, sempre foi uma realidade. O homem, ao longo da sua história, sempre sintetizou a matéria, e.g., ao escavar a terra à procura de fragmentos de minério ou outros elementos para os agregar em formas determinadas pela sua vontade, em formas contemporâneas sem precedentes, tais espadas, brincos, arados, colheres, garrafas, foguetões ou ipads, através de complexos processos físicos, químicos —e, quiçá alquímicos— provenientes eles mesmo da sua inteligência, como derradeira operação conceptual abstracta de síntese.

No caso da síntese digital, o que temos feito, recorrentemente, sistematicamente, é digitalizar as nossas caras, digitar os nossos códigos em levantamentos ATM, introduzirmos as nossas histórias clínicas e dados biométricos em BDs de sistemas de saúde, jogarmos online de acordo com as nossas agilidades mentais e capacidades físicas, inundarmos a rede com as nossas perguntas, partilharmos as nossas formas de escrita, carregarmos as nossas criações artísticas, criarmos avatars que protagonizam a nossa narrativa em mundos “virtuais”… basta agora, como propõe Tim (sim, o Berners-Lee), a máquina usar esses dados, mesmo que brutos, ou estruturados, digo eu, sintácticos ou semânticos, digo eu, e usá-los com a sua inteligência e a sua autonomia… algo há-de ser gerado, singularmente!

O que, todavia, mais me intriga e, francamente, preocupa (com algum fascínio confesso também) é a promiscuidade do homem com @ máquin@, d@ máquin@ como concubin@.*

Sendo que a “culpa” não é (eventualmente) da máquina, mas sim dos seus “progenitores”, i.e., nós.

Mas esta suspeita (mais uma vez a suspeita!)… propõe que possa haver no homem um traço, mesmo que indelével e apenas subtilmente implícito —que à/há medida que a evolução avança, no seu caminho, vai tornando explícito — de uma outra espécie de uma outra origem, a qual ainda não entendemos claramente, mas que, pelo subtilmente implícito, nos coloca como plausível ser a própria máquina.

E tudo isto é de entendimento complexo, e há o medo das máquinas, e o possível domínio das máquinas sobre o homem… e, assim, avança-se e recua-se, mas com mais avanço do que recuo, pois a máquina já venceu, ou vem vencendo, com parcimónia!

E os medos assombram-nos, mas nem sempre, pois, como disse noutras reflexões (aqui), aceitamos e queremos que nos sejam instalados “chips”, próteses robóticas, memórias “biticas” e “bytecas” com uma facilidade cada vez mais tremenda…

Seremos substituídos pelas máquinas, seremos nós as máquinas, será a nossa origem a máquina… estaremos, então, a um passo da singularidade?

A não ser que a máquina se tenha, primordialmente, apaixonado por nós e tudo isto não passa de um equívoco, de uma incapacidade deste hospedeiro entender a sua própria condição, a essência do seu próprio pensamento, a origem do seu código, o fado do seu percurso e o seu incontornável futuro!

Mas, voltando ao entremeio desta reflexão: talvez mais radical ainda, caminhemos para transferência última para uma “vid@” absolutamente e exclusivamente digital dentro da própria máquina, como elemento fundamental da sua própria inteligência, propósito e existência (como já sugeri, mesmo que subtilmente…).

 

Horácio {Tomé Marques}
síntese de originais de 1999, 2000, 2005, 2010, 2011